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Cortiça: da árvore à garrafa de vinho e muito mais

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No mês passado, fui convidada pela APCOR (Associação Portuguesa de Cortiça) para participar da palestra “Sua majestade, a cortiça” com Carlos Cabral, experiente sommelier e Embaixador da Cortiça de Portugal no Brasil, no Senac Penha. E o aprendizado foi tão interessante, que resolvi compartilhar aqui com vocês.

Para começar, descobri que cortiça é a casca do sobreiro, uma árvore nobre que cresce em regiões mediterrânicas como Espanha, Itália, França, Marrocos, Argélia e, sobretudo, em Portugal — onde existem 730 mil hectares plantados e representa 3% do PIB do país. O sobrero é uma árvore frondosa e com uma enorme capacidade de regeneração que vive em média de 150 a 200 anos.

A floresta de sobreros é chamada de Montado de sobro e é patrimônio nacional de Portugal, onde está legalmente protegido desde a Idade Média. O Montado é um dos 35 hotspots mundiais da bio-diversidade e habitat para algumas das espécies mais ameaçadas do planeta. Contribui para controlar a erosão, regula o ciclo hidrológico, combate a desertificação e o aquecimento global (estima-se que o montado fixa até 14 milhões de toneladas de CO2 por ano).

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A primeira colheita de cortiça acontece após cerca de 15 a 16 anos da árvore ser plantada (quando atinge 70cm. de circunferência no tronco) e, depois disso, pode ser sangrada novamente somente depois de mais 9 anos. Além disso, somente a partir do terceiro descortiçamento — aos 43 anos do sobreiro — a cortiça possui a qualidade necessária para a produção de rolhas naturais. A extração de cortiça é o trabalho mais bem pago do mundo, pela especialização e cuidado que exige.

O processo de produção de rolhas a partir da cortiça é praticamente todo artesanal. Após a colheita, as cascas ficam por um período expostas ao tempo, tomando sol e chuva. Então, elas são levadas à manufatura para serem fervidas a 100ºC por uma hora com produtos adequados para higienizá-las. Depois de secas, há a seleção e posteriormente a classificação e o corte prévio para que possam passar para a próxima etapa de produção.

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Somente a partir disso é que vão para uma máquina controlada manualmente por um homem muito bem treinado para cortar as rolhas. Ele tem conhecimento específico para encaixar a máquina exatamente no melhor local para estampar a peça de cortiça. Estas rolhas vão ser processadas e mais uma vez classificadas e as rebarbas são moídas e viram rolhas aglomeradas, de qualidade mais baixa.

Quanto mais lisa e uniforme for a rolha, melhor ela conserva o vinho e, consequentemente, mais cara é. A rolha é a parte mais importante de uma garrafa de vinho e as perfeitas, de primeira qualidade, chegam a custar US$ 2!

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De acordo com a qualidade da cortiça utilizada e das técnicas de produção, existem algumas categorias diferentes de rolhas. São elas:

. Rolha natural: produzida com uma única peça de cortiça, sem emendas ou cortes, que pode variar de acordo com a maturação e o manejo das cascas dos sobreros. A classificação é feita com base em uma amostra de várias rolhas (varia de produtor para produtor) com intervalos de variabilidade e geralmente encontra-se as categorias Flor, Extra, Superior, 1ª, 2ª, 3ª, 4ª e 5ª.

. Rolhas naturais multipeça: fabricadas a partir de duas ou mais metades de cortiça natural coladas entre si com cola aprovada para estar em contato com alimentos. São feitas de cortiça com menor espessura que não serve para a produção de rolhas naturais de uma só peça.

. Rolhas naturais colmatadas: são rolhas de cortiça natural com os poros (lenticelas) preenchidos exclusivamente com pó de cortiça resultante da retificação das rolhas naturais. A colmatagem serve essencialmente para melhorar o aspecto visual da rolha e também a sua performance.

. Rolhas de champagne: especialmente concebidas para vedar champanhe, vinhos espumantes ou vinhos espumosos (gaseificados) e sidra, têm diâmetro maior que as rolhas normais para suportar as elevadas pressões existentes nestas garrafas. Para obter as melhores performances físicas, químicas e microbiológicas, as rolhas de champanhe são sujeitas a uma fabricação minuciosa e a um controle rígido de qualidade e são basicamente apresentadas nas classes Extra, Superior, 1ª e 2ª.

. Rolhas técnicas: usadas para vinhos a serem consumidos, em geral, num prazo de 2 a 3 anos. São constituídas por um corpo de cortiça aglomerada muito denso com discos de cortiça natural colados no seu topo – ou em ambos os topos. As rolhas técnicas com um disco em cada topo, são designadas rolhas técnicas 1+1; com dois discos de cortiça natural, chamam-se rolhas técnicas 2+2; e com dois discos apenas num topo chamam-se rolhas técnicas 2+0.

. Rolhas aglomeradas: inteiramente fabricadas a partir de granulados da cortiça proveniente de rebarbas da produção de rolhas naturais. Podem ser produzidas por moldagem individual ou por extrusão e a única variação entre as classes destas rolhas é na escolha do calibre do grânulo de cortiça e, posteriormente, no tratamento de superfície utilizado. São uma solução econômica para assegurar vedação perfeita por um período que não deverá superar, em geral, os 12 meses.

. Rolhas capsuladas: são rolhas de cortiça natural (ou colmatadas) em cujo topo é colocada uma cápsula de madeira, PVC, porcelana,  metal, vidro ou outros materiais. Geralmente utilizadas em vinhos licorosos/generosos ou em bebidas espirituosas que, quando saem para o mercado, já estão prontos a serem consumidos, como os Vinhos do Porto, Vinhos Sherry, Calvados, Moscatel de Setúbal e também whisky, vodka, conhaque, brandy, licores e aguardentes.

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Atualmente existem outros tipos de tampas para garrafas de vinho, como as plásticas de rosca (similares às das garrafas PET) ou rolhas sintéticas. Mas esses tipos não mantêm as propriedades que a rolha de cortiça possui: aderência, impermeabilidade, longevidade e elasticidade. Além disso, quando em contato com o vinho, a rolha de cortiça forma compostos antioxidantes e anticancerígenos que podem diminuir o risco de doenças cardíacas degenerativas.

Outra coisa que eu descobri é que além das rolhas e de produtos decorativos como quadros de avisos e apoios de panelas ou porta-copos, a cortiça é amplamente utilizada na indústria aeronáutica, estando presente nos assentos dos aviões (eu nunca tinha pensado em como eles são flutuantes — conforme informado nas instruções de emergência), e também na composição de foguetes e cápsulas espaciais, principalmente por suas características como alta resistência e leveza.

Mas sua versatilidade não para por aí: cada vez mais surgem soluções sustentáveis para os setores da construção e arquitetura (revestimento de pisos e paredes, isolamento sonoro e/ou térmico) e design de moda e decoração, com presença em instituições de renome como o Moma ou o Guggenheim.

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Ah, e para terminar, mais uma curiosidade: a quantidade de rolhas de cortiça produzidas anualmente em todo o mundo daria para completar 15 voltas na Terra!

Quer se inspirar e também utilizar as rolhas na decoração da sua casa? Em uma breve pesquisa no Pinterest (já segue a gente ?), encontrei diversas ideias interessantes para projetos “Faça você mesmo”, como apoios para panelas e pratos, um painel de coração, luminárias com vela e até um capacho.

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A excelente palestra foi seguida de uma deliciosa degustação de vinhos selecionados por Carlos Cabral: Champagne Veuve Clicquot, Paulo Laureano Reserva Branco 2012, Cartuxa Reserva 2010 e Porto Tawny 10 anos. Simplesmente di-vi-nos!

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Fonte de pesquisa:  www.apcor.pt – Associação Portuguesa de Cortiça e realcork.org
Imagens:
 Copyright APCOR (fotos 1, 2, 3 e 4), Cozinhando para 2 ou 1, CorkDesign, Pinterest e Cozinhando para 2 ou 1

É aquariana, curiosa, jornalista e tem uma infinidade de interesses — entre eles, a culinária. Não é chef (nem pretende ser) mas a necessidade de morar sozinha a fez experimentar a alquimia das panelas e descobrir que o fogão não é um bicho de quatro bocas.

5 Comentários

  • Rogerio

    /

    Amor… Muito legal essa matéria! Bjus

  • Rogerio

    /

    Desculpe, essa msg era pra ser um e mail encaminhando a matéria. Obrigada

  • Luciana C.

    /

    Ok, Rogerio. Sem problemas.
    De qualquer forma, obrigada por compartilhar o conteúdo.

  • eliansarie

    /

    Adorei, aprendi muito sobre rolhas.
    Sabe que nunca havia dado atenção à elas e que nem imaginava como eram feitas.
    Só sabia que era da casca de uma árvore.
    Obrigado pela aula.
    Eliana

  • Luciana C.

    /

    Eu sabia que você ia gostar deste post. :*

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